Jerónimo de Sousa acusa Governo de
assistir impávido à escalada insuportável
dos preços dos combustíveis

Lucros da <i>GALP</i> viram «bezerro de ouro»

O PCP desafiou o Governo a agir no sentido de travar a escalada dos preços dos combustíveis, por via, por exemplo, de um sistema de preços máximos. Esta seria uma «medida de grande alcance económico», assegura o Secretário-geral do PCP, mas o primeiro-ministro foge dela como o diabo da cruz.

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Foi essa recusa liminar que ressaltou do debate quinzenal de sexta-feira passada, depois de Jerónimo de Sousa puxar o tema para primeiro plano numa intervenção inicial onde elencou a sucessão imparável de medidas governativas que estão a infernizar a vida dos portugueses.

 

Face às repercussões da subida insuportável do preço dos combustíveis quer nas famílias quer no tecido económico, nomeadamente sobre muitas pequenas e médias empresas, o repto que o dirigente comunista lançou a Passos Coelho foi para que este viesse a considerar, por exemplo, um sistema de preços máximos que «fosse compatível com a viabilidade das empresas e o poder de compra dos portugueses».

 

«Há uma coisa que este Governo não vai fazer: criar défices tarifários por intervir directamente em tarifas que são hoje resultado de formação de preço em mercado», respondeu o primeiro-ministro, explicando que se o «Governo impusesse um tecto, um preço máximo que o mercado não reconhecesse teriam de ser os impostos dos contribuintes a cobrir a diferença».

 

E insistiu na ideia de que o Governo «não pode artificialmente fixar os preços», que a única forma é «através dos impostos», sendo que, neste caso, o «País sabe que não estamos em condições de poder fazer nenhum alívio sobre o imposto sobre produtos petrolíferos ou sobre o IVA».

 

 

 

Fardo pesado

 

 

Explicações que não satisfizeram minimamente o líder do PCP, levando-o, na réplica, a interrogar-se sobre as razões que levam o primeiro-ministro a ter sempre uma referência em relação à questão dos impostos e aos custos para os contribuintes mas nunca a encarar a possibilidade, por exemplo, de ir buscar aos lucros fabulosos dos accionistas de grandes empresas um contributo por mais modesto que seja para resolver o problema dos preços dos combustíveis.

E lembrou, a propósito, que desde a liberalização dos combustíveis, operada com o então primeiro-ministro Santana Lopes e com o ministro de Estado Paulo Portas, a GALP mais do que quintuplicou os seus lucros anuais, ou seja, desde 2004, obteve 1168 milhões de euros de lucro.

A inexistência de uma única medida que seja para aliviar este insuportável fardo sobre as famílias e a economia, num momento em que as pequenas e médias empresas tanto precisam que os custos dos factores de produção baixem, levou ainda Jerónimo de Sousa a lembrar como vão longe os tempos em que o discurso do actual chefe do Governo era outro, bem diferente.

«Não vale a pena o Estado dizer que não podemos fazer nada, que estão a pagar os combustíveis mais caros porque o petróleo está mais caro, isto é apenas parte da verdade», dizia então Passos Coelho, recordou Jerónimo de Sousa.

«Afinal, quando era oposição, parecia que valia a pena fazer alguma coisa», observou o líder comunista, realçando assim a mudança de agulha do chefe do Executivo. Crítica que tornou extensiva a Paulo Portas, ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, também ele, «com aquele ar olímpico», sempre pronto a «malhar» no anterior governo devido à questão dos combustíveis mas agora incapaz de mexer uma palha, sem qualquer «proposta para uma questão que está a levar ao sufoco das famílias, das empresas, da economia».

 

Lucros intocáveis


«É essa a resposta que têm: não fazer nada», acusou Jerónimo de Sousa, perante um Passos Coelho que ainda voltou a escudar-se no argumento de que o Governo não tem folga para «mexer nos impostos», que disse ser a margem de que dispõe para actuar na formação do preço final dos combustíveis.

E tentando justificar a cambalhota no discurso, invocou o facto de agora o País estar sob «assistência financeira», o que antes não acontecia. Hoje a margem de manobra é «nula» e antes era «alguma», sustentou, falacioso.

Quanto a essa outra possibilidade real que é ir buscar alguma «margem» aos lucros dos accionistas, recusou-a totalmente, alegando que empresas como a GALP pagam este ano mais impostos do que as restantes empresas.

Assumindo quase o papel de solicitador da GALP, disse mesmo que o que explica os seus lucros não tem que ver com os preços dos combustíveis mas com muitas «outras operações importantes».

O que levou Jerónimo de Sousa, no final, a fazer notar que a GALP obteve em média entre 2002 e 2003 lucros na ordem dos 139 milhões de euros e que entre 2004 e 2011 o lucro médio se cifrou na casa dos 668 milhões de euros.

Não colhe, por isso, o discurso do Executivo PSD/CDS-PP de que está de mãos atadas, que não pode fazer nada.

O problema é outro e foi ainda o Secretário-geral a decifrá-lo: é que o Governo «não quer tocar nos lucros da GALP», erigidos que foram a autêntico «bezerro de ouro».


Colapso da mentira e da propaganda

 

«Um ano depois da assinatura do pacto de agressão, temos um País mais desigual, mais injusto, um País mais pobre, mais dependente, um País mais endividado», afirmou Jerónimo de Sousa, descrevendo na sua primeira intervenção em debate aquela que definiu como a realidade que «não pode ser escondida».

E citando António Aleixo – «para a mentira ser segura e atingir profundidade tem de trazer à mistura algum fundo de verdade», escreveu o poeta –, o dirigente comunista estabeleceu a analogia entre este verso e o que o Governo «tem andado a fazer e a dizer».

O Secretário-geral do PCP aludia, concretamente, ao sentimento profundo de indignação gerado a partir do «lapso» do ministro das Finanças sobre o tempo e os cortes de usurpação do subsídio de férias e de Natal, sentimento esse ainda mais ampliado com o anúncio de novos cortes nos apoios sociais, na proibição das reformas antecipadas, na escalada insuportável do aumento dos combustíveis, na nova subida do desemprego, no aumento da insolvência das pessoas individuais e colectivas.

Foi aliás essa onda de rejeição e repúdio que terá levado as bancadas da direita, diligentes, a virem em socorro do Governo, trazendo o tema a debate sob a forma de confortáveis perguntas ao primeiro-ministro.

E fizeram-no porque sabem que existe não só esse clima de insatisfação e revolta como têm também clara «consciência de que a operação de propaganda das inevitabilidades, da resignação, sofreu um rude golpe», assinalou Jerónimo de Sousa, anotando que os portugueses vêem que «há muita conversa, há sempre a referência do amanhã que nunca mais chega», enquanto a sua vida não pára de «piorar».

Concluiu, por isso, não ser este um «lapso» do ministro das Finanças mas sim «um colapso da mentira e da propaganda».

Passos Coelho, furtando-se ao essencial da questão – expediente em si cada vez mais recorrente –, e depois de divagar sobre a «reincidência do discurso do PCP» quanto ao pacto de agressão – na igual tentativa vâ de camuflar mentiras e contradições do seu governo –, adiantou querer «apenas reafirmar» o que, segundo ele, diz «desde o início»: que «a suspensão dos subsídios far-se-á pelo período em que vigore o período de assistência económica e financeira e a sua reposição – que acontecerá por imperativo constitucional – será feita de forma gradual».

E mais não disse sobre o assunto, evitando quaisquer detalhes.

A confirmar, assim, afinal, a razão de Jerónimo de Sousa, quando resumiu o quadro nestes termos: «Já que o Governo diz que não houve medidas adicionais, falemos então de um tempo adicional à medida adicional de saque dos subsídios».

 

O bife e as gorduras...


Questão colocada no debate por Jerónimo de Sousa foi ainda a relativa ao chamado «corte de gorduras do Estado» tão propagandeado pelo Governo.

E a este respeito trouxe a lume o apoio da CGD, com centenas de milhões de euros, a operações especulativas levadas a cabo por melos e queirós pereira, e à venda «ao desbarato» da sua posição na CIMPOR, «desarmando o Estado da maior empresa industrial do País, enquanto as pequenas empresas morrem à míngua do crédito».

E por isso o dirigente comunista considerou estar a assistir-se a «um escândalo», que, além do mais, mostra «que era tudo conversa» quando Passos Coelho «dizia que queria cortar as gorduras do Estado».

«O que está a fazer é cortar o bife do lombo e entregá-lo aos grandes interesses, aos grandes grupos económicos», acusou, sem obter resposta de Passos Coelho.



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